Artist Insights com Nigel Hitchcock
A nossa série “Artist Insights” quer trazer ideias frescas e novas abordagens para ajudar cada um a alcançar o potencial musical. Através da proximidade com os artistas, esta série apresenta dicas, truques e experiências de músicos profissionais de todo o mundo... e é um recurso que está sempre disponível.
O que aconteceu ao "Estilo"?
Estive recentemente no evento YAMAHA Live! Big Bang em Londres, no Bloomsbury Ballroom. O Louis Dowdeswell conduzia a banda e... wow... que músico fantástico! Estava a tocar trompete ao estilo Maynard Ferguson, com um som muito potente e uma entoação fantástica, a atingir uma amplitude estratosférica! Ao longo dos anos, já tive o prazer de tocar com muitos trompetistas fantásticos, mas o Louis leva a taça. No entanto, este texto não é sobre ele...
Fiquei muito feliz por ver um amigo próximo, Dave Bishop, a tocar saxofone tenor. Quando tinha 11 anos, conheci o Bish num ensaio na NYJO. Nessa altura, já era um músico de bebop surpreendente (tinha o estrondoso Tubby Hayes como seu herói), que já tinha tomado de assalto o mundo de músicos de sessão e que abandonou a NYJO para desbravar outros caminhos. O seu som e o seu tempo (tal como a sua leitura e execução) eram e continuam perfeitos. Eu olhei imediatamente para o Dave como um excelente exemplo de como tocar!
Claro que haviam muitos outros, demasiados para serem mencionados aqui, mas Jamie Talbot, “lead alto” da NYJO, era uma influência semelhante. Vi-os sentarem-se lado a lado no primeiro ensaio da NYJO (National Youth Jazz Orchestra) a que tive oportunidade de assistir e apercebi-me imediatamente de que partilhavam uma ligação especial. Tocavam sempre como um só, como se estivessem mentalmente ligados. Fui ensinado a tocar como o Marshall Royal e o Jonny Hodges (Basie e Ellington), mas tinha acabado de descobrir o Charlie Parker e o Michael Brecker, e estes dois também percebiam a nova linguagem bop/funk.
Durante os meus anos na NYJO, só os vi algumas vezes, mas foi sempre memorável, de tal forma que me inspiraram a ser como eles. Sinto-me grato por ter passado tanto tempo com eles durante a minha carreira enquanto músico de sessão. E são ambos excelentes amigos.
Enquanto falava com o Bish, depois deste espetáculo da Yamaha, ele elogiou-me e mencionou o quanto gostou de me ouvir como “lead alto”, de ouvir as notas tocadas com precisão, dentro do tempo, com afinação, swing e estilo. Por exemplo, os pequenos swells entre as notas, o trazer a afinação de baixo, de vez em quando, por vezes a aplicar um pouco de vibrato perto do fim de uma nota. E não por acidente, mas sim com intenção, porque foi assim que aprendemos a tocar!
Deu-me o maior elogio, quando disse que o “Tio Andy ficaria orgulhoso”. Estava a referir-se ao lendário Andy Mackintosh. Recordei um momento em 1990, com o Bish, quando estávamos a tocar com Shirley Bassey. Foi a minha primeira digressão “real” com uma superstar, e não conseguia acreditar que estava sentado ao lado do Bish, com o Andy Mac e o Geoff Daley nos altos e Jay Craig no barítono.
Estar sentado ao lado de excelentes músicos é, de facto, a única forma de aprenderes a tocar. Podes ouvir e ver música no Youtube toda a tua vida, mas até sentires o vento ao teu lado (ou atrás de ti), sentires o mexer da língua e ouvires o som da nota a sair de um grande músico mesmo ao teu lado, não vais conseguir compreender realmente a diferença.
O primeiro ensaio marcou a minha vida. Apercebi-me de que estava a tocar todas as notas com uma antecedência de milissegundos em comparação com o Bish e o Andy. Parei. Comecei a ouvir com muita atenção a relação entre o tempo deles e o som da bateria.
Tocámos de novo e desta vez tentei “esperar” pelo tempo, tal como eles faziam. No final da música, recebi um “Yeah!!” do Andy. O Bish olhou para mim e lançou um sorriso. Disse-me: “Estás a ver, é tudo um pouco mais tarde do que pensas e tens de ter coragem para esperar tanto tempo. HaHa!!!”
E assim, de um momento para o outro, a minha vida mudou! Comecei a perceber e a sentir o tempo de uma forma diferente e nunca mais consegui ouvir músicos a antecipar (ou a prolongar!), ou que não conseguem sentir o ritmo ou que não têm groove. Aprendi mais com experiências como esta do que de outra forma qualquer. O segredo foi sempre tocar com músicos melhores que eu!
Quando entrei no meio das sessões de estúdio, percebi que este “Clube do Tempo” era algo que todos tínhamos em comum enquanto músicos. É o que faz com que consigas ler uma pauta extremamente difícil, juntamente com 20 outros músicos, e tudo soar imediatamente como um álbum finalizado. Tem de soar bem – e é este sentido do tempo, em conjunto, que torna tudo possível. Mas não acaba aí!
A capacidade de combinares o teu som com que está à tua volta também é essencial, e se todos tiverem a mesma ideia de estilo, swells, vibratos e pequenas inflexões que trazem tanto às notas, então o efeito geral vai ser amplificado de forma exponencial. Os músicos da minha geração, assim como os anteriores a nós, sabiam que isto era essencial para o som geral de uma banda.
A aprendizagem destas competências no início da minha vida musical foi a razão pela qual consegui criar música que considero fantástica. O Andy, Bish, Jamie e eu, eramos solistas com os nossos próprios estilos individuais e sons facilmente identificáveis, mas enquanto equipa, tocávamos como um só!
Enquanto secção de saxofone, tocámos em inúmeras sessões durante os anos 90 e colaborámos com artistas como Robbie Williams, Tom Jones, Bjork, Spice Girls, Ray Charles, etc, assim como também em bandas sonoras para filmes e jingles para TV. E claro que todos fizemos muitas outras coisas. Nessa altura, não havia falta de trabalho de estúdio!
O ensino dos vários estilos de tocar foi passando de geração em geração, como acontece com uma receita secreta. Os estilos de bandas como Glenn Miller e The Geraldo Orchestra até Benny Goodman, desde Count Basie, Duke Ellington e Nelson Riddle até Ted Heath... foram todos passados de boca em boca ao longo dos últimos 80 anos. Mas parece que é uma arte que começa a ser esquecida... Com as novas gerações, os estilos de música mudaram drasticamente. Os dias das big bands a tocar ao vivo para o público dançar terminaram e a verdade é que, nos dias de hoje, gerir uma big band é um ato de coragem!
Atualmente, há cada vez menos músicos com um estilo uniforme, por isso há uma tendência de os músicos tocarem de forma individual, e de uma maneira que é unicamente auto-satisfatória. Independentemente da forma como a nota sai... parece ser sempre boa o suficiente. E também parece que cada um tem um conceito, ideia e gosto diferente na música. Sempre foi assim, mas havia um sentido comum de estilo!
Claro que algumas das melhores músicas de sempre são tocadas sem vibrato, dinâmicas, inflexões e afinações perfeitas. Notas excelentes e ideias incríveis podem ser o suficiente. Mas sempre acreditei que devia ser uma escolha, não algo predefinido, e fico feliz por ter todas estas técnicas no meu arsenal e, com sorte, ter uma sonoridade que capte a atenção e envolva o ouvinte, ANTES mesmo de eu decidir as notas que vou tocar. Pode não ser a preferência de todas as pessoas, mas acredito que seria triste a música perder todas as qualidades de estilo das eras anteriores. E ainda mais triste se as oportunidades da era digital diminuírem as oportunidades de se progredir pelo simples facto de nos sentarmos ao lado de alguém melhor e se poder aprender apenas a ouvir e sentir música ao vivo, em primeira mão – no fundo, da maneira como TODA a música foi passada entre gerações, ao longo dos anos.
Nigel Hitchcock
Desde a sua adolescência que Nigel Hitchcock tem fascinado o público com a sua técnica prodigiosa e capacidades de improviso. Ao longo da sua carreira, já atuou com inúmeros artistas, incluindo Tom Jones, Wet Wet Wet, Beverley Craven, Ray Charles, Robbie Williams e Mark Knopfler. Editou 3 álbuns a solo e hoje em dia continua a sua carreira de sucesso como músico pop e de sessão. Nigel toca com YAS-82ZGP, YTS-82ZGP e YSS-82Z.